Uma descoberta científica recente nas profundezas da Amazônia brasileira revelou uma nova espécie de borboleta, pertencente à família Lycaenidae, que exibe uma complexa e notável relação simbiótica com formigas nativas e cochonilhas. O anúncio oficial foi feito por pesquisadores em 29 de julho de 2025, com base em observações realizadas em áreas remotas da floresta tropical.

Borboleta Annulata kaminskii detectada na Reserva Particular do Patrimônio Natural do Cristalino, em Alta Floresta, (MT) — Divulgação/Luísa Mota
A espécie recém-identificada, batizada como Annulata kaminskii, surpreende pela sofisticação de seu comportamento mirmecófilo, uma interação onde insetos estabelecem relações mutuamente benéficas com formigas. Esta é a segunda espécie de borboleta descoberta na Reserva Particular do Patrimônio Natural do Cristalino, localizada em Alta Floresta, Mato Grosso, uma região que abriga mais de mil espécies de borboletas.
Mimetismo químico avançado e dependência ecológica
O estudo detalha que as larvas da Annulata kaminskii desenvolveram um mecanismo evolutivo refinado: elas produzem sinais químicos que imitam os feromônios das próprias larvas de formiga. Essa estratégia permite que as borboletas enganem as formigas operárias da colônia, que passam a proteger as larvas da borboleta como se fossem suas próprias crias. Em muitos casos, as pupas da borboleta chegam a ser guardadas dentro dos formigueiros, recebendo cuidados constantes das formigas.
A interação, descrita como um mimetismo químico avançado, é considerada rara entre as borboletas amazônicas e representa uma forma de associação muito mais complexa do que as observadas em algumas borboletas europeias, como as do gênero Phengaris.
A relação simbiótica da Annulata kaminskii envolve também as cochonilhas (insetos da ordem Hemiptera). As lagartas da borboleta se alimentam do néctar e da cera produzidos por cochonilhas que habitam bambuzais. Após o consumo dessas substâncias, as lagartas da borboleta secretam outro tipo de néctar, que é então aproveitado pelas formigas da região. Em contrapartida, as formigas oferecem proteção tanto às lagartas da borboleta quanto às cochonilhas contra potenciais predadores.
Pesquisa e implicações científicas
A descoberta foi realizada por uma equipe de pesquisadoras brasileiras, vinculada à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e ao Instituto Federal de São Paulo (IFSP). As pesquisadoras Luísa Mota e Noemy Seraphim estiveram entre os cientistas envolvidos no trabalho. O estudo detalhando esse comportamento único foi publicado na renomada revista científica Neotropical Entomology.
Este achado sublinha a imensa biodiversidade ainda inexplorada da floresta amazônica, que continua a surpreender a comunidade científica com espécies e comportamentos biológicos singulares. A nova borboleta da Amazônia levanta questões cruciais sobre:
- As sofisticadas estratégias de sobrevivência de insetos em ecossistemas complexos.
- Os intrincados mecanismos de comunicação interespécies.
- O papel fundamental dos sinais químicos na ecologia tropical.
Os próximos passos da pesquisa incluem a identificação precisa da planta hospedeira da borboleta, a espécie exata de formiga envolvida nesta aliança e a determinação do nível de dependência dessa relação para a sobrevivência da Annulata kaminskii. A importância da Reserva Particular do Patrimônio Natural do Cristalino e de outras áreas protegidas é reforçada por descobertas como esta, que destacam a necessidade contínua de investimentos em pesquisa e conservação ambiental no Brasil.